Insónia e Ansiedade: quando os nossos inimigos dormem juntos

Todos nós passamos por períodos de tempo em que há um ou mais problemas que nos tiram o sono. No entanto, para algumas pessoas a insônia não é uma fase, mas sim um pesadelo constante.

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Itzel

Imagine este cenário: chega a casa depois de um dia do trabalho e come alguma coisa. Como está cansado, começa a tirar os sapatos e a vestir aquela roupa confortável. Pouco a pouco, vai-se preparando para dormir. Mas começa a sentir ansiedade, porque sabe que adormecer não vai ser algo assim tão simples. Certamente ficará na cama, a olhar para o teto até que seja madrugada, ou talvez acorde durante a noite com frequência e sem motivo aparente. Nos piores casos, mais uma direta, passa a noite toda acordado. Soa familiar?


As opiniões relativas à qualidade do nosso sono diferem muito de cultura para cultura ou de país para país. No Brasil, 40% da população admitiu "não descansar adequadamente à noite", enquanto no Japão a mesma pergunta é respondida afirmativamente. Em Portugal, 35% das pessoas sente bastante sonolência durante o dia.

De acordo com o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC), nos Estados Unidos, 1 em cada 3 pessoas padecem de pelo menos uma forma moderada de insónia. Mesmo sendo uma percentagem esmagora, a insónia é geralmente uma condição muito pouco relatada pelos pacientes em visitas de rotina aos profissionais de saúde.

Os motivos, por outro lado, são variados, uma vez que a insónia pode ser causada por alguma condição física adjacente (como asma ou hipertireoidismo), a ingestão de alguma substância ou alguma condicionante da saúde mental do indivíduo.

De acordo com um estudo publicado em colaboração com o Departamento de Ciências da Saúde da Universidade de Oklahoma, em 2014, 92% dos casos de insónia existem num contexto de transtorno psiquiátrico. O mais comum deles é o Transtorno de Ansiedade Generalizada. À primeira vista, esta afirmação parece fazer sentido. Contudo, é compreensível que, fora do campo acadêmico e de investigação científica, permaneça a eterna questão de causalidade do ovo e da galinha. Será que tenho ansiedade porque não consigo dormir ou não consigo dormir porque tenho ansiedade? A resposta não é exata, uma vez que uma das razões mais frequentes para a ansiedade do sono é precisamente aquela causada por sabermos que teremos poucas horas para dormir. Mesmo assim, pacientes com ansiedade tendem a sentir maior insatisfação com a quantidade ou a qualidade do sono com maior frequência.

Posto isto...

O que acontece quando a Insónia e a Ansiedade são melhores amigas?

Simples: Enquanto elas têm sonhos cor-de-rosa, nós passamos a noite acordados. Mas porquê? Quando a insónia e a ansiedade se aliam contra nós, há sempre uma terceira parte envolvida: incerteza.

Uma das vantagens que temos sobre os restantes animais na Terra é a nossa capacidade de procurar pistas e padrões que nos permitem desvendar e prever o resultado de algo. No entanto, essa grande qualidade da consciência humana tem, igualmente, um lado negativo bastante tóxico: preocupação, medo ou até pânico do futuro.

Sabemos que o futuro existe, mas não sabemos o que vai e como vai exatamente acontecer e não podemos controlá-lo totalmente. De acordo com um estudo realizado nos Estados Unidos, essa incerteza pode causar um alto grau de stress. Isso, claro, pode tornar-se um caso grave de ansiedade.

Para medir nossa a incerteza, uma equipa de investigadores do Canadá desenvolveu uma "escala de tolerância à incerteza". Através dela, é possível medir quanto é que um indivíduo deseja estar num ambiente previsível e como reagirá a uma situação ambígua ou difícil de controlar. Em resumo, quanta incerteza consegue digerir antes de sentir náuseas.

Geralmente, os humanos preferem um ambiente controlado. Estamos mais confortáveis com a verdade do que com o incerto. Até existem estudos que mostram que preferimos receber um choque elétrico naquele momento do que a ansiedade que vem com a espera, sabendo que talvez ou talvez não o vamos receber mais tarde.

O mais curioso é que cada pessoa se sugeitaria ao choque num horário diferente. Podemos comparar os nossos sintomas quanto à incerteza com os das alergias. Uma pessoa pode ser severamente alérgica ao marisco e acabar no hospital incapaz de respirar só porque o restaurante serviu um bife cozinhado na mesma panela que antes foram fritos camarões. Outra pessoa, pelo contrário, pode comer uma espetada de marisco e apenas sentir apenas algum desconforto na garganta.

Isto ocorre porque a forma como o nosso cérebro avalia a incerteza é bastante complexa, uma vez que não há evidências, até à data, para provar que existe uma área específica nele dotada de mais ou menos ansiedade. Em vez disso, o nosso cérebro tende a comparar experiências passadas com nosso presente para tentar encontrar padrões que ajudam a prever o futuro. Se esses padrões forem confusos ou não temos informação suficiente, começamos a sentir-nos ansiosos. É assim que determinamos se a situação em que nos encontramos representa ou não representa uma ameaça a diferentes níveis.

Se o nível de ameaça for determinado como "alto" para certas ocasiões, o nível de ansiedade aumentará em paralelo. Isto pode facilmente traduzir-se em noites sem dormir. No entanto, existem algumas estratégias que nos podem ajudar a combater a ansiedade em momentos importantes.

Estar ansioso e entusiasmado são duas faces da mesma moeda

Provavelmente já esteve numa situação stressante e as pessoas ao seu redor continuam a dizer para respirar fundo e tentar acalmar. Sabemos que isto raramente funciona. A razão é que a ansiedade e a euforia são as duas possíveis representações de um estado emocional "alto", enquanto a depressão e a calma são as duas maneiras pelas quais apresentamos um estado emocional "baixo".

Não podemos passar de "alto" a "baixo" em questão de segundos. É mais fácil e mais eficaz tentar transformar a ansiedade no tipo de euforia que sentiria se o seu melhor amigo comprasse um voo para visitá-lo após vários anos de se contentarem com chamadas de vídeo.

Um estudo da Universidade de Harvard mostrou que substituir a resposta "Estou ansioso" por "Estou entusiasmado" levou a alguma melhoria em situações comumente consideradas stressantes, como um teste de matemática, uma apresentação oral ou até mesmo cantar num karaoke.

A parte interessante dos resultados é que o registo da frequência cardíaca de todos os participantes era semelhante, sem distinguir entre aqueles que disseram estar "entuasiasmados" e aqueles que disseram estar "ansiosos". Esta técnica é particularmente útil quando se trata de situações em que devemos permanecer alerta, mas se o que queremos é dormir, provavelmente não seremos capazes de ficar entuasiasmados ou ansiosos. Então o que é que podemos fazer quando queremos dormir mas sofremos de ansiedade?

Mudando de perspectiva

Na grande maioria dos casos, a insónia ocorre de repente. Um dia, o paciente percebe que não consegue dormir ou que, apesar de dormir, não descansa. Talvez continue repetindo para si mesmo que isso é normal, que vai passar. Mas quando menos espera, semanas se passaram e é tão difícil adormecer que, neste momento, o paciente até tem medo da sua própria cama.

Nos últimos anos, tem havido uma tendência crescente na terapia cognitivo-comportamental. Esta é uma estratégia do campo da Psicologia que procura mudar a nossa relação com o sono e com o espaço em que dormimos a partir das suas fibras mais profundas.

Em 2015, a popular revista científica "Annals of Internal Medicine" publicou um estudo que procurou determinar se este tipo de terapia tem, de facto, algum efeito sobre os pacientes adultos que sofrem de insónia crónica. No final da pesquisa, os cientistas concluíram que a terapia cognitivo-comportamental (TCC-i) é eficaz neste tipo de pacientes.

Para determinar isso, empreenderam a tarefa de analisar os resultados de pelo menos 20 estudos clínicos e 200 artigos científicos. Mas como todas as pesquisas, existem algumas limitações, das quais se pode destacar que nenhum outro grupo de pacientes foi considerado e seus critérios de inclusão foram bastante reduzidos, pois só tiveram em conta pacientes que sofrem de ansiedade e insónia, sem considerar outras possibilidades como depressão e insónia; ou hipertireoidismo e insónia. No entanto, são estas limitações que ajudam o resto da comunidade científica a continuar a tarefa de ampliar o nosso conhecimento sobre o assunto e procurar uma solução mais eficaz.

Em contraste, a TCC-i é a única estratégia que não tem risco de dependência ou efeitos adversos. Este tipo de terapia inclui técnicas como a supressão dos sentidos. Isto é, proteger o nosso quarto de toda a luz e som para que nosso corpo tenha a tendência de dscansar na ausência de estímulos. Além disso, geralmente é sugerido uma sessão por semana durante pelo menos 5 semanas, em que se pretende que o paciente associe gradualmente o seu quarto ao repouso e não ao sofrimento, melhorando assim a sua qualidade e quantidade de sono progressivamente.

Embora a terapia comportamental cognitiva não represente um risco inicial para o paciente, é uma estratégia baseada em medicamentos, ao qual aderem porque primeiro é mais rápida e geralmente mais precisa. Embora neste caso, exista o risco de dependência e habituação. De todas as formas, qualquer que seja a estratégia que desejamos seguir é importante ter em mente que devemos sempre ter a orientação de um médico porque...

Ansiedade nem sempre é o motivo

A insónia pode ter uma causa física ou genética subjacente. Investigações recentes mostraram a correlação entre certas doenças como a asma. Noutros casos, há uma alteração genética rara que produz insónia crônica que se torna fatal para o paciente. As chances de ser esta a causa são extremamente baixas, mas quando isso acontece, o indivíduo sofre uma rápida deterioração das suas funções neurológicas até que acaba por morrer.

Mesmo que este não seja o caso, a falta de sono pode tornar-se perigosa para nós e para aqueles que nos rodeiam, por exemplo, quando conduzimos. Quando não descansamos corretamente, os nossos reflexos são diminuídos e a nossa capacidade de concentração é menor. Portanto, se durante várias semanas tem pelo menos duas noites em que não foi capaz de adormecer ou sentiu constantemente que, embora tenha adormecido, não descansou o suficiente descansa, este é o momento de visitar o seu médico.

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